domingo, 13 de junho de 2010

Por que eu ainda sou uma adolescente

Juliette GrécoAquela frase, Eu era feliz e não sabia, ah, como eu a odeio. Naturalmente que você não ia saber. Quando se é feliz, você só é feliz, pronto. Não precisa ter consciência, precisa sentir, você é feliz, se sente feliz, sorri e vai levando a vida. Sair por aí dizendo que é feliz e sabe disso é pura perda de tempo, pura perda de felicidade. Preocupante mesmo seria dizer que era feliz e não sentia, aí sim devemos dedicar um pouco do cérebro a refletir.
Já uma frase que é realmente compreensível e perfeitamente aplicável a mim é: Eu tinha tempo livre e não fazia a mínima ideia. Como eu me achava tremendamente ocupada no ano pré-vestibular, deus do céu! E como eu não fazia absolutamente nada. Me privava de cinemas, de alegrias, porque tinha que estudar all the time all the time, e em vez disso lia romances e admirava desenhos. Na faculdade eu bem tratei de me ocupar, pra evitar toda aquela crise existencial do pré-vestibular que bem nasceu do monte de tempo livre. E agora, oh céus, como eu só queria um dia pra respirar e não fazer nada, nadinha, nadinha. Mas não posso, porque é tanto, tanto a fazer, e não dá pra desperdiçar um segundinho que seja. Ontem, no hospital, no quarto onde meu avô está deitado, levei livro e minha agenda para atualizar minha vida (tenho escrito religiosamente sobre todos os dias, e os relatos quase sempre ultrapassam a única página disponível), porque há uma semana não escrevia, mas estava tão, tão mentalmente exausta que tive que deitar e me apertar sem fazer nada. Acabei dormindo, mas que tempo bem gasto, viu, ainda que eu me sentisse uma droga desperdiçando toda aquela hora em que poderia estar me divertindo, ou estudando, ou cuidando de meu avô (que, diga-se de passagem, ignorou minhas ofertas de ajuda).
E eis o fim de semestre, mas que cão! Mil provas todas as semanas, muita matéria que eu não estudei, ocupada fazendo relatórios e circuitos, falando francês e correndo de uma sala a outra. Ainda tem o projeto final de Eletrônica Digital, que está louco para nos sabotar, e eu tenho até medo de dizer que vai dar tudo certo. E o projeto final de Instalações Elétricas, e o de Métodos Numéricos, que é para amanhã, deus do céu.
Mas bom. (Avalanche de palavras, depois de tão longo silêncio!) É fácil deduzir daí que tudo o que eu tenho querido é fugir. Pra bem longe, ficar de turista e quem sabe nunca voltar, porque quando se é turista aquela incrível sensação de liberdade é permanente e você está numa cidade que parece te acolher e abraçar.
Aí eu aluguei Educação. Que não me ajudou, nem um pouco. Jenny tem 16 anos e um homem mais velho se apaixona por ela, e faz ela se apaixonar por ele e pelo mundo cheio de glitter do jazz e do glamour. Jenny veste roupas bonitas, conhece lugares incríveis, viaja, viaja, viaja. Jenny questiona: pra quê estudar?, morro de tédio na escola, vou morrer de tédio na faculdade e ainda tenho que morrer de estudar tedioso latim para poder passar. David a pede em casamento. Mamãe comentou que David era um malandrão, e eu concordei só por concordar, com o queixo caidíssimo de encanto pela história de amor, sem entender porque essas coisas apaixonantes insistem em não acontecer comigo.
ParisOntem, rodando o centro com amigos atrás de circuitos integrados e motores de passo, comprei meu primeiro piratão: Garota Fantástica, título chocho comparado ao intraduzível Whip It. Dois reais, com direito a capa e cenas que travam. Novamente, Bliss é uma garota que só quer sair da sua timidez, da sua insignificância e de sua cidadezinha de interior. Entra (travando) em cena o Roller Derby, um esporte agressivo e feminino sobre oito rodas que trua legal, Bliss se descobre uma excelente jogadora, namora um cantor de banda indie e de quebra ganha muitas amigas de cabelos coloridos. Se antes Bliss era mocinha, Babe Ruthless é durona e, nota-se, impiedosa. E é assim que eu queria ser quando crescer, durona, implacável. Eu posso já ter 19 anos, mas é pensar como eu quero me tornar que me motiva, e eu quero ser muito, muito durona, mulher de fibra. Mamãe mesmo, grande ícone, é mãe solteira. Eu, garota entre 40 machos na faculdade. Adoro isso. Adoro me ocupar e não ter tempo livre, faz parece que eu sou a mulher maravilha, ainda que isso me enlouqueça nos fins de semana. É aí que eu me dano.
Derby girlsO esporte é demais. Vendo as cenas de pancadaria, até sinto que nesse esporte eu me daria bem, e fico louca pra tirar da minha gaveta meus patins para sair por aí em círculos, batendo em garotas, sendo durona. Agora que garotas, né. E quando, considerando minhas provas e observando que já estou há duas horas nesse texto, sem sair do lugar, sem tocar num livro, e ai que dor de estar perdendo tempo, mas ai que prazer de estar escrevendo. É que eu sou só uma adolescente, e adoro ser adolescente, pensar em meninos, escrever páginas e páginas de carta sobre o mesmo garoto, ser fútil e impulsiva, rir alto e de tudo. E desculpa garoto da manhã se eu ri de você, mas quando eu estava perguntando entre sorrisos "Vamos lá, vamos lá, olhem seus relógios, que horas serão, que horas serããão?", eu estava só ajustando o relógio do nosso projeto, que é um Automatizador para Alimentação Animal e faz um motor girar de acordo com a hora da primeira alimentação (inserida pelo usuário) e com o período que o usuário escolheu (2 em 2 horas, 4 em 4, 6 em 6 e 8 em 8, que finalmente parece estar funcionando sem falhas), não era pra saber a hora real, então você não precisa ter respondido que eram 17h30. Desculpa, mas eu adoro ser imatura e boba, adoro essa época que eu estou vivendo.
Whip it!