segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Cráu

Quando criança, minha brincadeira favorita era esconde-esconde, mas eu também era doida por carimba e sete pecados. Enquanto morei no condomínio da Marcondes Pereira, andava de bike no pátio todo, e descia a rampa de patins. Me dava super bem com todas as crianças do prédio (exceto aquela vez em que dei um mega ataque de egoismo e berrei e chorei porque vi Tiago e Raissa brincando no meu quarto com todas as minhas coisas de Barbie espalhadas pelo chão enquanto eu assistia TV dodoi na sala, sendo que eu tinha deixado eles irem pro meu quarto brincar), e entre os jornaizinhos e os remédios que a gente inventava, também viviamos em guerra com o nosso vizinho. Tinha um pé de siriguela que dava pros dois lados, e era siriguela pra la e pra ca com todas as forças que crianças de 8 anos tem, em dias de batalha. Uma vez teve uma febre de catapora, mas eu não peguei. Outra vez, para rivalizar com o Clube dos Meninos, nós meninas criamos o Clube do Desenho. Eu mandava e desmandava e adorava isso, o Lucas me chamava de vaca louca (gente) e eu saia correndo atras dele com meu sapo de pelucia me sentindo a propria Mônica (eu achava o maximo).
A escola é um ambiente estranho, né? Por algum motivo, as coisas não se saiam tão bem por la. Entre ser a ultima a ser escolhida no futebol, ter vergonha das minhas notas (boas) e me sentir a menina mais feia da turma, não consegui guardar nenhuma amizade do Ensino Fundamental. As vezes eu acho que minha natureza introspectiva nasceu no ambiente escolar e so com muitos anos de reconstrução eu consegui me reestabelecer como aquela menina tagarela e ansiosa por gente dos primeiros anos, ou pelo menos um pouco.
Mas se meu trauma das noites em claro chorando porque não tinha amigos (aos 11 mudei para um prédio de idosos) foi rapidamente identificado, a minha aversão a esportes ficou. Os amigos, eu arranjaria, mas ficar encostada na parede até o arrastado final da escolha dos times e sentir aquele olhar de tô-pegando-você-porque-é-o-jeito do lider, isso eu não queria nunca mais. Basta de humilhação. No Ensino Médio, passei três anos arranjando atestado médico falso dizendo que eu não podia fazer exercicio fisico. A minha piada era que meu esporte era corrida... atras dos ônibus.
Quando eu me inscrevi para uma semana de esqui, eu estava mais curiosa pela aventura do que pensando na atividade fisica. Entre o nosso prô que colocava o oculos escuro por cima do gorrinho, nossos colegas tão iniciantes e exultantes quanto a gente (Mélanie, coitada, desceu rapido demais e se meteu dentro de uma faixa, bem cena de filme pra chorar de rir), as toneladas de protetor solar no rosto (e mesmo assim bronzeei) e as pistas verde, azul e vermelho (preto não que é muito dificil!), eu amei aquilo. O vento frio correndo pelas bochechas, a imensidão branca das montanhas que querem tocar o céu, a adrenalina de descer e descer e descer e descer e depois subir nas cadeirinhas olhando todo mundo formiguinha pra descer e descer e descer tudo de novo. Rafael me chamava de robôzinho, eu toda dura me concentrando muito mesmo pra que aquela ultima queda fosse realmente a ultima queda da semana.
O esqui entrou pra magra lista das atividades que eu gostava: patins, patinação no gelo, esqui. Uma lista tão chic que até parece uma espécie de autoboicote. Então eu pensei, pensei, e decidi que tinha que achar uma alternativa mais acessivel, em particular algo que eu pudesse praticar na minha terra natal. Ai eu pensei no surfe. Esquiando nas ondas.


A ideia era otima, adoro a vibe dos surfistas e a sensação de ter uma conexão com o mar, logo eu, Janaína Iemanjá, mas eu não sabia nadar. Animada com meu namorado que foi trabalhar numa usina nuclear e morou numa cidadezinha fim de mundo e uma das poucas coisas legais que tinha la era a piscina olimpica onde ele ia nadar todo dia, me inscrevi na natação.


Estou la firme e forte. Ainda não aprendi o crawl direito e borboleta nem vamos conversar. Alguma coisa me captou. A agua é morninha e às vezes na lua cheia, quando nado costas, nós duas (eu e a lua) ficamos brincando de quem pisca primeiro perde. Geralmente sou eu. A prô me ajuda a colocar a touca, porque senão eu ia acabar arrancando uma sobrancelha (ou duas!), e às vezes pega pesado comigo, mas ela quer me mostrar que meus limites sempre estão mais longe do que eu penso.
Estou amando não ser boa, e tentar, tentar, tentar, e ficar orgulhosa de ter melhorado um pouquinho. Mês passado, fizemos uma prova de resistência. A aula inteira nadando crawl, pra ver quantas voltas conseguiamos dar. Cheguei 10min atrasada e fiz 32 voltas. Meu coleguinha de 9 anos fez 78. Meu dentista tem 80 anos e também nada, começou a aprender mesmo quatro anos atras. Entre uma competição e outra, acabou ouro do Nordeste nos 100 e nos 400m. Categoria 80-84. Por enquanto estou na desvantagem, mas esperem so mais quatro anos...